*Por Ludmila Queiroz
O machismo está presente em cada canto da nossa
sociedade. Submetidas ao patriarcado, as mulheres sabem o quão árduo é a busca
por sua autonomia e liberdade. Quando então discutimos a chegada das mulheres
ao poder, tão mais penoso é a estrada, em qualquer espaço. No PT não é diferente, no movimento estudantil
também não.
O PT, partido que elegeu a primeira presidenta do
país, partido que elegeu a primeira negra ao senado, pioneiro na busca pela
equidade de gênero nos espaços de direção, uma luta histórica das petistas, com
inicialmente as cotas de 30% e agora, a partir do 4º congresso, a paridade de
gênero para os cargos de direção, ainda caminha a passos muitos lentos em
direção a uma real igualdade de condições de disputa e ocupação dos espaços
de poder. Como o feminismo, na maioria das vezes, não se torna pauta central do
partido, vemos a perpetuação de atitudes machistas, como a relação utilitarista com as
companheiras, criando as laranjas por exemplo, e com a histórica falta de apoio
as candidaturas de mulheres.
No M.E., da
mesma forma, encontramos o machismo que permeia toda a sociedade e a
universidade. Não é difícil identificar
a subvalorização das mulheres que atuam nesse movimento: são muito menos
respeitadas que os homens nos fóruns públicos. Logo, a desqualificação delas
que assumem papéis protagonistas é comum. Não é raro também, a intimidação
política se vestir de assédio sexual. Tem homem dirigente que se aproveita
dessa condição pra tratar as mulheres como mercadoria ou moeda de troca. São
poucos os espaços que discutam o feminismo. O recorte feminista não chega aos
debates gerais. Há uma naturalização de situações explícitas de opressão. E
isso é apenas a reprodução da lógica machista da nossa sociedade, repetida (de
forma consciente ou não) por companheiros e companheiras.
Homens e
mulheres têm seus papéis sociais determinados de forma específica. Somos acostumadas desde crianças com as
nossas ações estarem associadas com o espaço doméstico e não com o espaço
público. Não é difícil reparar na distribuição desigual nos cursos por gênero,
sendo os cursos “masculinos” mais valorizados do que os “femininos”, resultando
na maior precarização das condições de trabalho, na menor participação das
mulheres nas instâncias acadêmicas, na pouca participação feminina nos espaços
públicos (inclusive nos fóruns do movimento estudantil). Tudo isso, somado à
falta de estrutura e falta de creches, obrigam as mulheres a abandonarem seus
estudos muito mais que os homens.
A precariedade das políticas de permanência
estudantil nas universidades atinge as mulheres de maneira muito especial, já
que somos nós que sofremos com a dupla ou tripla jornada de trabalho, que
inclui o estudo, o cuidado com a casa e em muitos casos seu sustento. O alto
índice de evasão dos cursos pelas mulheres acontece principalmente pelo fato de
não contarem com uma estrutura que dê conta dessas demandas, o que faz com que,
além de dificultar uma formação de qualidade, provoque um distanciamento dos
espaços de articulação política. Isso sem mencionar, os menores salários ainda
que cumpram as mesmas funções no mercado de trabalho. Quanto maior for a
formação acadêmica, maior será a diferença entre os salários de homens e
mulheres.
Em tempo: Ao fazer o recorte racial, mulheres
negras, em especial as pobres, que acessam a universidade, (seja pelas cotas,
seja pelo FIES, por exemplo) sofrem ainda mais com essa falta de estrutura,
jornada dupla ou tripla de trabalho e com a falta de um política de permanência
estudantil que dificulta ainda mais o rompimento das barreiras do racismo tão
presentes na sociedade, que somados ao machismo, cria um ciclo cruel de
invisibilidade às negras.
Necessário também afirmar que, no movimento
estudantil secundarista, a realidade não difere muito. Meninas desde cedo
convivem com a dupla jornada de trabalho e tem mais dificuldades de serem
atuantes nos grêmios e espaços de tomada de decisão. Além disso, a realidade é
que muitas meninas não conseguem terminar o ensino básico até os 18 anos.
Gravidezes precoces e indesejadas interrompem os estudos, prejudicam a qualidade
da formação. Por isso se faz imprescindível uma política de educação sexual sem
hipocrisia, que dê autonomia à mulher para escolher se (ou quando) engravidar e
caso ocorra, a legalização do aborto é saída que queremos pra decidir sobre
nossos corpos “Educação sexual para prevenir. Métodos contraceptivos para decidir.
Aborto legal para não morrer.” Isso é o que queremos!
Outro ponto fundamental a ser discutido no M.E.
pelas mulheres é a questão da subjugação de
seus corpos, a cultura do estupro presente nas universidades e até nos
espaços de organização do movimento estudantil. São recorrentes as denúncias de trotes humilhantes, as queixas de constrangimentos
vividos pelas mulheres nas festas e nos campi das universidades, que se
relacionam diretamente com a questão da cultura do estupro, condenando a mulher
por sua sexualidade e punindo-a com diferentes formas de violações: agressões,
constrangimentos e até o estupro.
A opressão, portanto, existe em todos os cantos da
sociedade em que vivemos, inclusive nos espaços que construímos com a
finalidade de combatê-la. Muitas vezes a questão de gênero é tratada ou com
descaso ou como concessão e, mesmo quando a luta feminista é reconhecida como
tarefa do Partido dos Trabalhadores ou do movimento estudantil, não há
envolvimento de forma dinâmica.
Reconhecendo entretanto os avanços na educação nos
últimos 10 anos, cada vez mais, têm mais alunos no ensino superior. Na verdade,
temos, cada vez mais, mais alunas no ensino superior. Conquistas importantes já
foram alcançadas. Hoje, dentro da UNE as mulheres compõem mais de 30% de sua diretoria, próximo passo: defender que todas as entidades estudantis tenha uma diretoria
com paridade de gênero. Afinal, se somos
maioria nas universidades, é justo que sejamos pelo menos, metade das
representações d@s estudantes.
Não perdendo de vista que não há socialismo sem
feminismo, convocamos todos e todas neste espaço de diálogo fundamental que é o
ENEPT, a construir, uma nova concepção de atuação no movimento estudantil e no Partido dos Trabalhadores, mostrando que as pautas feministas devem estar nos
itens prioritários da nossa agenda. Que as reivindicações das mulheres
estudantes possam se tornar de fato de tod@s estudantes, de tod@s @s petistas.
Ludmila Queiroz é universitária, membro do Coletivo de Mulheres Negras RJ, Secretária de Combate ao Racismo da JPT RJ e militante do Movimento PT.